Todo o artigo apela ao senso surrealista de cada um. Ao que parece trata-se de um regulamento interno em que são estipuladas coimas para vários comportamentos desviantes (presumo) dos jovens atletas. Aqueles passam por várias situações, que vão desde o "uso de telemóvel no balneário" (0,15€) até ao "cartão vermelho (anti desportivo [sic])" punido com 5€. Pelo meio vamos encontrar outras coimas por coisas como "atraso ao treino" (0,20€ por minuto), "tocar o telemóvel no balneário" (0,20€), "urinar no chuveiro" (0,50€), "cartão amarelo" (0,50€), "gases perturbadores (peidos)" [sic] (0,20€), ou "chapadas no rabo do colega" (1€) – para quem quiser deliciar-se a ler todas as "infracções", veja aqui.
Em face disto nem percebo porque só o item "actos homossexuais" causa brado nas touradas. Tirando as coimas que visam promover um mínimo de higiene e civilidade, todo o documento é uma pérola de lirismo e de refinamento cultural. Algumas curiosidades:
1 – Considerando que faz sentido que as faltas injustificadas (ao treino ou aos jogos), os comportamentos anti-desportivos e os atrasos (uma vez que calculada a coima por minuto) sejam alvo das coimas mais elevadas – são estes os comportamentos promotores da pontualidade, do espírito de equipa e do tão apregoado espírito desportivo -, não se entende porque é que o "cartão amarelo" é punido com um valor tão baixo, já que pode ter origem num comportamento agressivo do jogador ou desrespeitador dos outros intervenientes no jogo (repare-se que o "desrespeito perante um colega" é punido apenas com 0,80€!).
2 – Pergunto-me o que terá ditado a existência do dito regulamento interno, considerando que a necessidade de legislação é normalmente ditada por um apelo do real; mais: se bem me lembro das "fontes do direito", diz a doutrina jurídica que a lei tem como fonte os "usos e costumes". Logo, daqui pode concluir-se que os tais "actos sexuais homossexuais" fazem já parte do modus vivendi da equipa.
3 – Olhando para os valores das coimas facilmente se percebe que aqueles que têm um valor mais elevado incidem sobre os comportamentos mais reprováveis, e o inverso para os de valor mais baixo. Mais: usualmente o valor inferior será sempre atribuído a um comportamento mais recorrente do que a um menos; ou seja: é normal (e desejável!) que ocorram mais vezes as infracções relativas aos telemóveis, do que as punições disciplinares. A esta luz, arrisco dizer que o "acto homossexual" será mais usual do que a "chapada no rabo", uma vez que o valor da coima do segundo é mais do dobro da do primeiro (relembro que as multas mais elevadas são sempre para actos mais condenáveis e, usualmente, até por isso mesmo, com menor ocorrência).
4 – Urge esclarecer a população em geral - e os jovens interessados em particular - do que é entendido por "acto homossexual", uma vez que já se percebe pelo regulamento que disso não se entende "chapadas no rabo do colega". Isso, todos sabemos, pelo menos todos os que já frequentaram algum balneário de rapazes adolescentes, é não só usual e recorrente (only God would know why, or not!), como é – naturalmente, claro está, está-se logo a ver – coisa de homem! Perdão: coisa de Omem!
5 – Conclui-se que é mais barato praticar um "acto sexual homossexual" do que "chegar atrasado". Logo, quando o Mister (ainda me hão-de explicar o porquê desta expressão) perguntar onde andaram, será melhor dizer que estiveram ali a penetrar o Fulano, ou a acariciar-lhe o viril membro sexual... Sabendo nós que tuga que é tuga arranja todos os estratagemas para não pagar as coimas que lhe são impostas, a par da célebre tradição nacional de nunca chegar a horas a lado nenhum (mea culpa, mea culpa!), já se pode imaginar a verdadeira revolução cor-de-rosa que irá naquela equipa!...
6 – Uma vez que o dito regulamento se cinge apenas à equipa de juniores, presumo que na sénior, a existir, o mesmo não se aplique. O que é, desde logo, uma pena e, à partida, uma descriminação intolerável.
7 – Pergunto-me (uma vez que o regulamento é omisso) de qual a coima (a haver) em caso de "acto sexual heterossexual e/ou bissexual", "orgia", "bondage", "zoofilia" (presumo que particularmente grave em casos que envolvam águias), e outras práticas sexuais mais heterodoxas… O mesmo se passa com um "acto sexual homossexual" com "palmadinhas no rabo": o que fazer? Aplica-se o regulamento cumulativamente, ou leva-se em consideração o espírito do legislador da mais recente versão do Código Penal, e, como lá a propósito do "acto pedófilo continuado", conta-se como uma única infracção? Por falar em pedofilia: um "acto homossexual pedófilo" enquadra-se na definição de "acto sexual homossexual" ou não? (Considere-se a propósito que as questões relativas ao consentimento para o acto sexual e à sua idade poderão concorrer para diferentes entendimentos jurisprudenciais a respeito. Aguarda-se o esclarecimento)
8 – Atentando ao número de jovens portugueses que já consumiram "substâncias ilícitas" e ao número médio de vezes, talvez uma norma sobre uso de drogas viesse a calhar… Não sei, é apenas uma sugestão.
9 – Considerando que 0,40€ é menos do que o preço de um café, só me ocorre saudar os responsáveis pela Casa do Benfica das Caldas da Rainha que, assim, admitem a existência de homossexuais a jogar futebol, e, o que causa ainda mais espanto, no Benfica! Só lhes fica bem, honrando assim a terra-adoptiva e a criatividade do grande Raphael Bordallo-Pinheiro! E só demonstra que o Portugal profundo é muito mais liberal do que as suas elites o julgam… Afinal só se pede que os jogadores homossexuais não andem no balneário em brincadeiras perigosas – é que, para além de se atrasarem, pode estragar a concentração...
Sic transit gloria mundi!
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