terça-feira, 30 de junho de 2009

segunda-feira, 29 de junho de 2009

As asas

Tocou-me uma assombrosa santidade
E senti o agitar das suas asas
Sobre mim. Erguendo-me acima das coisas
Os dedos entrelaçados nos meus
As asas sobre mim agitando-se ao passar
Não sei de nada igual, senão talvez
O vento a esvoaçar entre os pinheiros
Na meia-sombra da lua ausente
Um vento que pressiona
e que não beija
Mas se agita, suave como a luz
Dos raios do crepúsculo nas veredas
Mas isso é pouco nobre e não é santo...
Seus dedos pousaram nos meus em bênção fremente
E por cima o agitar de asas tão sagradas.



Ezra Pound








© Alvin Langdon Coburn, Vortografía de Ezra Pound, 1917

domingo, 28 de junho de 2009

Migrações kitch


Já aqui falei da minha pulsão por tudo o que possa ser considerado por muitos como lixo. Nada como um programa do tipo reality show, ou uma musiquinha pimba, para me encherem as medidas e me deixarem às gargalhadas por horas a fio! Eu sei que deve haver cura para casos perdidos como o meu, mas enquanto não se tornar impeditivo da vida normal é apenas uma filia como outra qualquer (e que grandes momentos de riso me proporciona!). Encontrei há pouco (ou melhor, reencontrei há pouco, porque em tempos que já lá vão, muito já tinha ouvido isto a outros padecentes do mesmo mal!) uma canção do Graciano Saga que, não sendo um clássico reconhecido pela crítica (o que é manifestamente injusto!), arrisca-se a sê-lo no campo do kitch (bem, ou pelo menos de algum fetichismo kitch…). Adiante! Esta peça é, na sua essência, um exemplo de pura poesia popular, ou seja, um exemplo claríssimo do pop português. Tudo nela apela ao sentimento, tudo nela apela à vida simples, à vida de todos os dias dos emigrantes de retorno à pátria, à tragédia dos dias comuns, sendo, por aí e também, uma clara citação da OdisseiaDe alguma maneira, pelo menos…



Ora, atentai na pérola que aqui vos deixo, que nada deve à malinha de cartão de Linda de Suza (ess'outro mito!)...





« "Imigrante vem devagar por favor, temos muito tempo para lá chegar e depois, lá diz o velho ditado: mais vale um minuto na vida, do que a vida num minuto."

Passou-se no mês de Agosto,
este drama tão cruel
de um imigrante infeliz
Foi tanta a pouca sorte,
na estrada encontrou a morte
quando vinha ao seu país
Do trabalho veio a casa,
preparou a sua mala
e partia da Alemanha
Mas seu destino afinal
acabou por ser fatal
numa estrada em Espanha
Dizem aqueles que viram
que ele ia tão apressado
a grande velocidade
Foi o sono que lhe deu
o controlo ele perdeu
desse carro de maldade

Foi o sono que lhe deu
o controlo ele perdeu
desse carro de maldade

Trazia na sua mente
ir ver o seu pai doente
que estava no hospital
Na ideia um só pensar
o seu paizinho beijar
ao chegar a Portugal
Mas tudo foi de repente
partiu de Benavente
o drama aconteceu
Ele vinha tão cansado
de tanto já ter rolado
e então adormeceu
Nada podendo fazer
num camião foi bater
e deu-se o choque frontal
Seu carro se esmagou
e desfeito ele ficou
num acidente mortal

Seu carro se esmagou
e desfeito ele ficou
num acidente mortal

Ele não vinha sozinho
trazia também consigo
sua mulher e filhinho
Sem dar conta de nada
e naquela madrugada
morrem os três no caminho
Quando a notícia chegou
no hospital alguém contou
o desastre que aconteceu
Seu pai que tanto sofria
nunca mais o filho via
fechou os olhos morreu
Imigrantes oiçam bem
não vale a pena correr
porque pode ser fatal
Venham todos devagar
há tempo para cá chegar
e abraçar Portugal

Venham todos devagar
há tempo para cá chegar
e abraçar Portugal
»


Graciano Saga


sábado, 27 de junho de 2009

Cinema paradiso

Houve um tempo em que o cinema era com actores e actrizes. Bruto, seco, rude, sem efeitos espectaculares fantásticos, sem magias de algibeira e varinhas de condão. Houve um tempo em que o cinema era (como o diria Manoel de Oliveira que ainda o faz) teatro filmado. Isto é, tão simplesmente, palavra animada, texto, densidade, textura, profundidade (da palavra e da imagem) sem excessos, sem pontas soltas, sem desperdícios - tudo concorrendo para a obra final (o texto, a decoração, a banda sonora, os planos, a iluminação, a fotografia, o guarda-roupa, os actores). Houve um tempo em que o cinema era avassaladoramente adulto. Houve um tempo em que o cinema amadureceu e se tornou vida. Houve um tempo em que este cinema abarrotava as inúmeras salas e era "comercial". Houve um tempo em que o que interessava era a narrativa contada e não o custo.


Era um tempo de requinte aristocrático. Um tempo do sonho. Um tempo a correr por entre os dedos... Em homenagem a esse tempo. Em homenagem a um dos grandes realizadores cinematográficos que a Europa (e o mundo) conheceu - Luchino Visconti. Em homenagem ao meu realizador italiano favorito. Em homenagem ao tempo do leopardo...





Canção das horas nº 21

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Em terra de Lacan, espeto de pau

Sempre me inquietaram as pessoas (ou instituições) que se julgam superiores às outras. Sempre me irritaram esses comportamentos e esses pensamentos. Mais do que a arrogância, o que mais me irrita é a sobranceria, a displicência, a triste presunção de superioridade. E a esquerda está impregnada dela. Poderíamos dizer que isso só acontece em Portugal devido às vicissitudes do processo revolucionário do qual ainda vivemos o rastro, que enviesou estranha e perniciosamente a sociedade para a esquerda. Mas não. Pelos vistos, não é só cá.


Acabo de escutar algumas declarações da esquerda francesa (a famosíssima e "reputadíssima" gauche, a tal que deu origem à própria designação – o que será sintomático!) e não me canso de ficar espantando. Saídos de uma imensa derrota eleitoral (uma das premissas base da esquerda é muito simples: os eleitores são sempre esclarecidíssimos e vanguardistas quando votam à gauche, e os mesmos eleitores são sempre burros, atrasados, perigosos para a democracia, xenófobos, racistas e afins quando votam à droite) nas recentes eleições europeias, a esquerda europeia (e a francesa muito particularmente) parece não ter aprendido nada! Comentando a remodelação governamental operada pelo Presidente Francês, Nicolas Sarkozy, duas posições foram vincadas. Uma diz que a remodelação nada vem mudar porque vem continuar "a política liberal que conduziu à grave crise que vivemos"; talvez seja bom alguém explicar a esses senhores que os eleitores, ou seja, o povo soberano (na melhor tradição rousseauniana) votou por essa "política liberal" (seja isso o que for no contexto continental europeu) contra – precisamente – a alternativa (só a palavra já me faz rir!) socialista (englobando aqui todas as esquerdas por processo simplificativo); logo, convém que aprendam a viver em democracia e passem a respeitar os resultados das eleições livres, caso contrário – aí sim! – poderemos falar de um ataque à democracia, ou, no mínimo, uma má relação da esquerda com a vivência democrática sempre que ela a afasta do poder. A outra considera "gravíssimo" que um sobrinho (a política e os negócios das polis europeias parecem estar pejadas de tios e sobrinhos…) do antigo Presidente Mitterrand (socialista) "aceite governar ao lado de Sarkozy", acrescentando que os ossos do antigo Presidente devem estar a dar voltas na tumba. Sem tecer mais considerações com o aspecto mais esotérico das afirmações, o que mais choca é ser-lhes totalmente inconcebível conceber a diferença, o pensamento diferente, a oposição (tout court). E isto agravado pela obrigação familiar em estar do "único lado da verdade", presumo…! Talvez seja (igualmente) bom alguém dizer-lhes quem foi o Presidente Mitterrand e quais alguns dos seus actos (como o atentado contra o Rainbow Warrior ordenado por" tão casta e venerável figura" – o ambiente é sempre uma flor da lapela da esquerda).




Ou seja: talvez seja melhor a esquerda francesa (e já agora a europeia) começar a frequentar os consultórios de psicanálise e similares. É que a recusa da realidade e a criação de um mundo paralelo começam a ser por demais evidentes e por demais patológicos! Eu, com sobranceria, até já começo a ficar constrangido!...








© Sofá de Freud.

domingo, 21 de junho de 2009

El pastorcico

Un pastorcico solo está penado,
ajeno de placer y de contento,
y en su pastora puesto el pensamiento,
y el pecho del amor muy lastimado.

No llora por haberle amor llagado,
que no le pena verse así afligido,
aunque en el corazón está herido;
mas llora por pensar que está olvidado.


Que sólo de pensar que está olvidado
de su bella pastora, con gran pena
se deja maltratar en tierra ajena,
el pecho del amor muy lastimado.


Y dice el pastorcito: ¡Ay, desdichado
de aquel que de mi amor ha hecho ausencia
y no quiere gozar la mi presencia,
y el pecho por su amor muy lastimado!


Y a cabo de un gran rato se ha encumbrado
sobre un árbol, do abrió sus brazos bellos,
y muerto se ha quedado asido dellos,
el pecho del amor muy lastimado




San Juan de La Cruz





© Salvador Dali, Cristo de São João da Cruz, 1951

sexta-feira, 19 de junho de 2009

Shahanshah*

Quando era pequeno a Pérsia evocava-me um reino maravilhoso. O reino dos tapetes e do exotismo. Cresci ainda sobre o choque que a Revolução dos Aiatolas provocara por , provocando a queda desse rasgo de modernidade que significava o Xá Mohammad Reza Pahlavi (e da Imperatriz Farah Diba, símbolo de elegância entre as senhoras de casa). Nunca por cá se usou o termo Irão sem logo acrescentar, "a antiga Pérsia", como se isso fosse um símbolo de resistência em face da barbárie islamita. Talvez por isso, ainda hoje, eu prefira usar o termo Pérsia (ocidental, bem o sei, mas que fazer? É essa a minha (in)condição!), recusando sempre o termo Irão – na minha cabeça o Irão é a terra dos Aiatolas, e a Pérsia a terra do Trono do Pavão, dos Xás, de Sherazade e das mil e uma noites. A terra do sonho e da fantasia, ou, se quisermos, a terra da poesia: ouvi recentemente que, por lá, é costume as famílias reunirem-se em torno dos túmulos dos poetas – situados em belos jardins, ou não fosse aquela a terra da Babilónia – para lhes honrarem a memória e lhes lerem poemas. Essa é uma bela e romântica imagem da Pérsia, que me agrada e que acarinho. Talvez para esquecer a confusão que o fanatismo me causa. Talvez para esquecer que um dos nossos berços está entregue às mãos de gente de vistas curtas, gente de burcas e de mãos cortadas. Talvez para esquecer que a Pérsia está transformada no Irão.


O que me consola é que há sempre esperança. Por mais que tentem, por mais que limitem, a esperança cresce sempre, resiste sempre. É, talvez, a matriz daquelas terras que clama uma liberdade perdida. É uma cultura milenar, é uma cultura de um dos grandes impérios de sempre (e uma das mais prósperas de sempre) que se quer libertar das amarras fundamentalistas que, uma certa leitura do islão, lhe impõe. Vejo as manifestações em Teerão, vejo os que morrem em nome da Pérsia e sinto o coração apertado. Sei bem que as revoluções são incertas e nunca, em tempo algum, trouxeram alguma coisa boa aos que as fazem; as revoluções são como Cronos, devoram sempre os seus filhos, são autofágicas e destruidoras. O regime dos Aiatolas conhecerá o seu fim (todos o conhecem). Queira Deus (Esse que nos é comum, da Pérsia à Lusitânia) que os seus filhos persas reencontrem o caminho da liberdade e do progresso! Que eles possam retomar o caminho (interrompido) iniciado por Ciro II! Que eles saibam honrar os seus avós (e nossos avós) e saibam cantar novos poemas nos túmulos de novos poetas!


Aqui deixo um grande documentário que retrata bem o que foi o reinado e o reino do último Xá da Pérsia. Como a maior parte das vezes tem sido (por essas paragens ainda mais), a monarquia é um agente de progresso, de prosperidade, inegável e incomparável. Veja-se o que era o Irão antes e o que é o Irão depois do Xá! Veja-se e compare-se. Veja-se e pese-se. Vejam-se os indicadores do Irão antes e compare-se com a situação catastrófica que hoje se vive. Veja-se a acção da Dinastia Pahlavi na modernização, na melhoria das condições de vida, e no fortalecimento do Irão, e compare-se com a política seguida pela "revolução dos mullah's". Parafraseando Ésquilo: Persas, vós que escutais, derramai lágrimas! Que a Pérsia volte a ser Pérsia!







*Rei dos Reis, Imperador.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Vozes III

(...)

Um Adamastor atarefado a compor o azul – eis o que te envio!

(...)

terça-feira, 16 de junho de 2009

Da Pérsia








aquele cujo coração não vive senão do amor
não morrerá jamais.



Hâfiz





© Pormenor do túmulo de Hâfiz, em Shiraz, no Irão

segunda-feira, 15 de junho de 2009

domingo, 14 de junho de 2009

Como um rio









... Ninguém nosso amor detém ...

sexta-feira, 12 de junho de 2009

ADN da democracia

A The Economist publicou recentemente um Democracy Index relativo a 2006, ou seja, uma lista ordenada dos países mundiais organizados tendo em vista a qualidade das suas democracias (ou a ausência de uma e da outra). Cinco factores foram tidos em consideração para esta análise: a) O Processo Eleitoral e o Pluralismo; b) O Funcionamento do Governo; c) A Participação Política; d) A Cultura Política; e) As Liberdades Civis.


Portugal obteve o 19º lugar entre 167 países. Mas há algumas coisas que saltam à vista e são evidentes. Entre as dez melhores democracias mundiais, oito são europeias (se olharmos para as vinte primeiras o número sobe para dezasseis). Os primeiros lugares são ocupados pelos países nórdicos com a Suécia a liderar. O que também não deixa de ser curioso é que, dos dez primeiros países, sete são monarquias (e, em vinte, metade são monarquias). E é curioso por dois motivos: por um lado, as monarquias estão em muito menor número no mundo do que as repúblicas; por outro, a propaganda republicana sempre proclamou uma suposta superioridade de regime em face da forma monárquica, coisa que não se confirma se olharmos às altas pontuações que as monarquias obtêm, por exemplo no que às Liberdades Civis diz respeito: apenas oito países conseguem pontuação máxima, sendo que de entre esses, seis são monarquias!



Já as dez piores incluem nove repúblicas e uma monarquia. E se olharmos para as vinte piores, dezoito são repúblicas e apenas duas são monarquias (a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos).


Coincidências? Não creio!




© Imagem aqui.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

Maravilhas Portuguesas no Mundo

Finalmente realizou-se a cerimónia de revelação das 7 Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo. Já aqui falei no assunto, mas ainda e apenas pela rama. Continuo sem perceber qual o critério que regeu a escolha destas e não de outras. Continuo sem perceber porque é que o continente europeu ficou de fora das escolhas. Continuo sem perceber o porquê da expressão "de origem portuguesa", quando muitas delas são maravilhas portuguesas, ponto.

Aquilo a que se assistiu na transmissão da RTP foi mais uma lição do que não deve ser feito nestes casos. Para uma ocasião anunciada como épica, o que ficou foi um sabor a amadorismo, a pequenez, a espectáculozinho… E – o que é ainda mais surpreendente – tudo foi feito sem esboçar uma única ideia do que foi a expansão portuguesa no mundo, quais as suas causas e quais os seus efeitos, quais as suas similitudes com outros movimentos da História e quais as suas idiossincrasias (a meu ver, mais estas do que as outras). Nada. Apenas uma glorificação saloia e remediada do "génio português" (sem nunca esclarecer o que raio isso fosse) que, ao que parece, empreendeu os Descobrimentos e a Expansão portuguesa para o Ultramar para fazer "amigos", abraçar os "irmãos", promover a "diversidade", doar "sorrisos" e, já agora, deixar obras de arte espalhadas pelo mundo porque-tinham-uma-pancada-muito-grande-e-deu-lhes-p'rá-i-pah! Até tiveram oportunidade de passar um pequeno documentário sobre a presença portuguesa na Índia, com os nossos compatriotas a chorarem e a lamentarem a ausência lusitana nas terras goesas e do Guzarate – mas aquilo que a mim me deixou em pranto (haverá coisa mais louca do que chorarem por nós a milhares de quilómetros de distância, lá, abandonados à sua sorte, sem apoio, sem contacto, sem religio dos laços?) foi encarado com um sorriso e como uma excentricidade curiosa, tudo sem consequências, sem ser assinalado, sem ser minimamente enquadrado/meditado. Ou seja: tudo muito new age e politicamente correcto. Uma miséria confrangedora, foi o que foi.


Mesmo sabendo que em tempos de "voto telefónico" e "voto cibernáutico" isso vale o que vale, fiz a minha escolha (partindo apenas das opções que nos eram dadas). Esta foi alicerçada em alguns critérios, a saber: excepcionalidade no panorama da cultura portuguesa; rigor da composição; capacidade técnica e inovação; originalidade; grau de preservação; qualidade da obra; distribuição geográfica; importância para a cultura (portuguesa, local, mundial); importância na história da Expansão portuguesa; síntese de estilos. Para figurar entre as 7 Maravilhas de Origem Portuguesa no Mundo escolhi:





* Sé de Goa, em Goa, na Índia – um dos mais belos exemplos de uma catedral portuguesa no mundo, numa magnífica síntese entre a arte europeia/ocidental e a arte oriental/indiana. Um monumento hindo-português admirável pelas dimensões, pela decoração e talha primorosa, pelo enorme e magnífico altar-mor (o maior de todo o Oriente), pela simbiose perfeita entre os estilos e tradições lá presentes. Acresce ser a sede do Patriarcado das Índias Orientais, essa dignidade rara atribuída a apenas 5 Prelados (para além do próprio Papa) no Rito Latino da Igreja Católica Romana (um dos quais é o Patriarca de Lisboa, o que comprova a importância dos portugueses reconhecida pela Igreja!).


* Igreja de São Paulo, em Macau, na China – Esta igreja (ou mais propriamente, esta frontaria, uma vez que pouco mais resta da igreja) é, talvez, o mais belo exemplo de arquitectura sino-portuguesa existente e, certamente, o mais belo exemplo de uma igreja jesuítica de raiz portuguesa. Ícone por excelência da Cidade do Santo Nome de Deus de Macau é ainda o símbolo mais florescente da extraordinária empresa que foi a evangelização do Oriente. Nela encontram repouso e memória os Mártires do Japão; nela o programa iconográfico mostra a verdadeira universalidade da fé cristã. Em qualquer concurso o seu lugar e o seu valor estarão sempre assegurados!




* Colónia do Sacramento, no Uruguai – um belo exemplo de uma cidade portuguesa na América do Sul, símbolo do Império Luso-Americano que tanto alimentou a imaginação e o esforço da nossa história e dos nossos antepassados até ao primeiro quartel do século XIX (o Abade de Baçal chegou a ter o sonho utópico de uma América unida sob o estandarte da Cada de Bragança!). É um símbolo porque não é brasileira; é um símbolo porque foi construída frente a Buenos Aires para ser o sinal da soberania lusitana; é um símbolo porque, apesar das vicissitudes da história, conserva o carácter de uma antiga cidade portuguesa; é um símbolo porque é o mais visitado dos sítios turísticos do Uruguai; é um símbolo porque nos une a uma outra América, não brasileira, e nos confunde com os caminhos do tango. Esta foi, confesso, uma das coisas boas que este concurso me trouxe: deu-me a conhecer a Colónia do Sacramento!


* Fortaleza de Diu, Ilha de Diu, Índia – uma das maiores, mais belas e mais fortes fortalezas portuguesas no mundo. Belíssima com os seus muros vermelhos foi inexpugnável durante séculos o que atesta a qualidade da sua concepção, bem como a capacidade militar e tecnológica dos portugueses. Símbolo lusitano no Guzarate, é um símbolo do nosso modo de fazer: foi construída através da diplomacia e mantida face a todos os ataques pela força das armas e da valentia dos seus defensores. É um dos mais belos lugares que já vi (infelizmente ainda não presencialmente) no mundo.




* Ilha de Moçambique, em Moçambique – capital histórica dos territórios que viriam a formar Moçambique (e origem do seu nome), é uma das jóias mais raras e mais bem conseguidas da presença portuguesa no mundo. Em tempos vi um documentário sobre a antiga carreira dos hidroaviões do Império Britânico que, do Cairo à África do Sul uniam os territórios de Sua Majestade Britânica em África. A penúltima das suas paragens era precisamente na Ilha de Moçambique, considerada a jóia da viagem: uma cidade europeia, de arquitectura requintada, elegante, de palácios e igrejas de traça clássica, um magnífico hospital de traça colonial/imperial, praças e jardins com candeeiros de ferro forjado a contemplar o azul do Índico… Desde então nunca esquecerei a impressão que me causou ver essas imagens (já lá irão mais de 15 anos), e ainda hoje a considero das coisas que mais nos devem orgulhar enquanto portugueses. É (reconhecida e merecidamente) o maior e o melhor conjunto de monumentos e construções europeias (dizer portuguesas é uma redundância) em África anteriores ao século XIX e atesta 500 anos de relações entre o Índico e o Atlântico Norte, entre as religiões do norte (cristianismo e islamismo) e os cultos locais. É uma pérola, uma beleza e um monumento maior dos portugueses que muito mais se deveriam empenhar na sua reconstrução/preservação.


* Fortaleza de Mazagão, em Marrocos – ai a Mazagão do nosso imaginário infantil, uma das famosas praças africanas por onde tudo começou! A sua história está ligada ao Reino de Portugal no norte de África, mas também, à história do Brasil: fundada pelos portugueses na costa africana, foi para a colónia americana que os habitantes de Mazagão partiram em 1769, abandonando a cidade africana e fundando na Amazónia uma nova cidade denominada "Nova Mazagão". Exemplo da arquitectura militar lusitana no norte de África contruída em tempo recorde, foi das maiores cidades portuguesas por . Ostenta ainda hoje, não apenas as muralhas e baluartes, mas também duas das igrejas que construímos, o traçado urbano de origem portuguesa e uma belíssima e utilíssima cisterna-monumento, que só por si, valeria a classificação e o prémio!



* Convento de São Francisco e Ordem Terceira, em São Salvador da Baía, Brasil – se no Brasil muitas e inúmeras eram as possibilidades de monumentos para serem maravilhas portuguesas (começando na própria cidade de São Salvador, passando pelo Real Gabinete Português de Leitura (no Rio de Janeiro), e terminando no próprio país, o Brasil!), parece-me que este convento reúne muito do que de melhor se construiu (artisticamente falando) em terras sul-americanas. Para além de ficar situado naquela que foi a primeira capital portuguesa em terras de Vera Cruz (São Salvador da Baía de Todos-os-Santos), cidade berço e ícone da cultura brasileira (e de um certo luso-tropicalismo), este é um monumento onde se sintetiza o programa barroco português (muito especialmente na sua versão brasileira), como aliás bem refere Pedro Dias: "espaço e funcionalidade, esculturas abundantes e belas, e um vulcão de talhas refulgentes, azulejos de primeiríssima plana, mobiliário de ricas madeiras locais, sobrecarregando os estilos europeus em que se inspiraram os marceneiros, pinturas de bons mestres, tudo isto faz deste conjunto de edifícios um caso excepcional, mesmo numa cidade tão rica como Salvador da Baía"


Se destes monumentos, quatro foram escolhidos como vencedores, outros houve que figuraram na lista final e que não considerei excepcionais, a saber: Basílica do Bom Jesus de Goa, em Goa, Índia (possivelmente por ser onde jazem os restos mortais de São Francisco Xavier); Convento de São Francisco de Assis da Penitência, em Ouro Preto, Brasil (um dos belos exemplos do barroco luso-tropical); Cidade Velha de Santiago, em Santiago, Cabo Verde, e este – talvez – o caso mais surpreendente (só compreensível em face do sistema de votação). A Cidade Velha de Santiago (antiga Ribeira Grande) é efectivamente um lugar histórico importante na medida em que foi a primeira cidade construída pelos portugueses fora da Europa. Mas o grau de devastação que a reduz a um sítio arqueológico mais duas ou três peças (igrejas, fortaleza e pelourinho) pouco importantes arquitectonicamente, não me parece que possa constituir causa suficiente para esta classificação. Parece-me sim que é uma ajuda para que a candidatura da Cidade Velha a Património Mundial certificado pela UNESCO tenha mais hipóteses de ser aceite (e justamente aceite, refira-se! Apenas a comparação com outros monumentos candidatos – do qual salta à vista a Ilha de Moçambique, ou mesmo as ruínas de Baçaim, na Índia, ambos os lugares com muito mais património e concepção mais rebuscada – a diminuem).


Enfim: sete anos depois da extinção da Comissão Nacional para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, perdeu-se mais uma hipótese (mais a mais uma oportunidade pop, tão ao gosto dos tempos que correm) de repensar a história e o contributo lusitano para a História do mundo. Outros virão!







© Sé Cadetral de Goa, São Paulo de Macau, Colónia do Sacramento, Fortaleza de Diu, Ilha de Moçambique, Fortaleza de Mazagão, Convento de São Francisco e Ordem Terceira


quarta-feira, 10 de junho de 2009

Cheira a Santos populares...

Lá vai a Bia que arranjou um par jeitoso,
É vendedor como ela ali para o em Formoso.
São dois amores, duas vidas tão singelas,
Enquanto ela vende flores o Chico vende cautelas.


Na Mouraria só falam do namorico
A Bia namora o Chico, as conversas são iguais.
Ai qualquer dia, Deus queira que isto não mude
Que a Senhora da Saúde vai ser pequena de mais.


O casamento já tem data marcada
Embora qualquer dos noivos tenha pouco mais que nada.
Vai ter a Bia, a festa que ela deseja,
Irá toda a Mouraria ver o casório na igreja.



António José



segunda-feira, 8 de junho de 2009

Os Lusíadas

Acabei de tomar consciência de como Portugal está – de uma certa maneira – morto. Completamente morto e esquecido. Levou-me a curiosidade a percorrer a imprensa online europeia e americana (nas línguas perceptíveis, bem entendido!) para perscrutar o que de nós por lá se diz. Quase nada. Quase nada. Quase nada. Nos principais jornais brasileiros (dando atenção aos resultados eleitorais em Espanha, na Itália, no Reino Unido, em França, na Alemanha, na Polónia), nem uma palavra. Nos principais jornais espanhóis, italianos, franceses, somos relegados para os fins de página, ao lado dos estónios, ou dos cipriotas. Nos jornais ingleses, diga-se em abono da verdade, pouco se fala do continente – mas eles sempre foram assim (e isso é algo que lhes admiro!). Apenas nos EUA há referências a Portugal (NATO dixit). Uma miséria. Uma miséria confrangedora e humilhante. Porque já fomos o centro da política europeia. Porque já fomos uma das potências europeias (e mundiais, a propósito!). Porque isto é o reflexo do estado (comatoso, certamente) da nossa diplomacia. Porque isto é o reflexo da falta de um rumo claro, de um objectivo nacional. Patriótico (o último que tivemos foi abandonado em 1975; desde então nada o veio substituir). Não existimos. Não somos lembrados. Não despertamos qualquer interesse. E isso, para alguém orgulhoso, é uma morte. Mais uma morte. Mais: uma morte!


Acho que vou pegar n' Os Lusíadas à procura de algum consolo. Quanto ainda tínhamos memória. Porque – se calhar – é tudo o que nos resta… Ou melhor: por enquanto é tudo o que nos resta.


domingo, 7 de junho de 2009

Diárias-notas de campanha

- Cada vez gosto menos de campanhas eleitorais com imenso espavento e circo. Cada vez as entendo menos. Porque não são necessárias. Porque ninguém fica mais esclarecido. Porque só servem como sorvedouro de fundos, como desperdício. Gosto sim deste tipo de campanha: barata, directa, eficaz. A campanha das ideias e dos ideais. Gosto da atitude, da disponibilidade para servir e para resolver os problemas (afinal, uma das raízes da política). Ao fim e ao cabo gosto de uma campanha que parta de uma simples questão: em que posso ajudar para transformar a sua vida?

- Apesar do cansaço evidente com a política e os políticos somos bem recebidos. Somos bem entendidos. Somos apoiados e gostados. Sem encenações: nota-se no olhar das pessoas, nota-se nos pequenos gestos, nota-se nas pequenas cumplicidades. Apesar de tudo a esperança ainda vive nos seus olhares. E nos nossos.


- Reforço a minha ideia da má imprensa que temos. Do mau jornalismo que temos. É chocante vermos como as coisas se processam nos bastidores. São sempre os mesmos que seguem, dia a dia, a campanha. Isso tira força às abordagens, consome-as por dentro. Ora são cúmplices ora são carrascos. Sendo a apregoada isenção jornalística uma das grandes balelas do tempo contemporâneo (nenhum olhar é isento), aquilo a que assistimos em Portugal é preocupante. Vejo uma peça sobre a campanha socialista em que tudo o que ficámos a saber do dia inteiro foi que Elisa Ferreira (a candidata a tudo que "só lá vai assinar o nome") se perdeu dos restantes colegas de campanha. E que ninguém sabia do seu paradeiro; das actividades, das propostas (a haver), do decorrer da campanha nem uma palavra – só o circo lhes interessa. Temos um jornalismo de polémica. Se as não há, inventam-se. Infelizmente é isso. Polemos no governo da polis. Nada mais. Infelizmente é pouco.


- Visitámos bons exemplos – o Lar da Misericórdia de Aveiro, a Quinta da Conraria (em Coimbra) da Associação de Paralisia Cerebral, a Adega Cooperativa de Almeirim. Que bom conhecê-los! Que pena que o resto não seja (no mínimo) assim!


- Oiço dizer uma coisa (a quem sabe) que me deixa a pensar: "as sondagens só servem para pôr os políticos a falar das sondagens". Pena é (acrescento eu) que continuamente falseiem a verdade sem qualquer consequência.


sábado, 6 de junho de 2009

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Para além da razão

Pessoas há que nos inspiram confiança. Pessoas há que nos despertam admiração. Que nos fazem acreditar nas coisas. Que nos fazem vibrar com uma causa, com uma ideia, com um projecto. São seres (infelizmente) raros. Infelizmente escassos. Porque têm carisma. Porque são competentes. Porque têm uma força invisível que nos envolve e que nos motiva.

Posso, hoje, dizer que Nuno Melo é uma delas. Pela inteligência, pela argúcia, pela frontalidade que já lhe admirava. E agora pela sensibilidade, pela atenção aos mais fracos, pela disponibilidade, pela combatividade, pela coragem, pela determinação. Pela firmeza. Pela rectidão. Pela honestidade. Pela força das convicções. E tudo isto é (ainda) mais raro hoje em dia. E ainda mais raro nos seres políticos (infelizmente). Se antes já tinha o meu voto (a opção ideológica nunca foi outra), agora posso dizer que tem o meu voto mais - tem a minha admiração. Mas quando digo isto não falo da admiração que sentimos por uma grande filósofo, por um grande político, por um grande artista, por um grande médico. Falo da admiração que sentimos por um grande homem. Sem "h" maiúsculo porque dele não precisa. Um homem. Um homem sério. Um homem justo. O que é admirável. E motiva e dá esperança.


Acompanhar Nuno Melo na sua campanha fez-me acreditar ainda mais na necessidade do político. E da política. Da política como serviço, como arte da minúcia, como arte da resolução dos problemas da polis. Da política como exigência de justiça. Da política como justiça.


Acompanhar Nuno Melo na campanha faz-me acreditar na integridade do político. Na integridade possível em política. Faz-me acreditar na força da seriedade, do trabalho e da verdade.




Obrigado, pois. Obrigado, pois, pela grande lição. Obrigado, pois, pela disponibilidade. Obrigado, pois, pela dádiva. Obrigado.


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